Novembro 2024
- Rita

- 31 de out. de 2024
- 21 min de leitura
Atualizado: 1 de nov. de 2024
“O homem transforma-se muitas vezes naquilo que acredita ser. Se eu disser continuamente a mim próprio que não consigo fazer uma determinada coisa, é possível que acabe por me tornar realmente incapaz de a fazer. Pelo contrário, se tiver a crença de que a posso fazer, adquirirei certamente a capacidade para fazê-la, mesmo que não a tenha no início.”
Mohandas K. Gandhi
Queridos alunos e amigos ✨,
Em NOVEMBRO, o horário mantém-se inalterado e haverá aulas todas as segundas, terças e quintas-feiras, de MANHÃ e à TARDE.
Gostaria, no entanto, de vos informar que, de MANHÃ, eu costumo chegar ao Shala🪷🍃 pelas 6h30, a maioria dos alunos começa a praticar por volta das 7h00 e termina a sua prática pelas 8h30, hora em que costumo iniciar a minha prática pessoal.
Tem sido assim há vários meses e, por essa razão, estou a considerar a possibilidade de tornar esse o “horário oficial” da MANHÃ, a partir do próximo ano. 6h30/8h30. Tenho a certeza que isto não aparece propriamente como uma surpresa… Para alguns de vós, é possível que se crie alguma resistência, dificuldade de adaptação, ou simplesmente falta de vontade de o fazer e, obviamente, como de costume, não tenho qualquer intenção de interferir com o vosso livre-arbítrio ou decisões.
É assim, avançamos de acordo com a Vontade Divina, fazendo o melhor que podemos, com as ferramentas que temos disponíveis, sem nunca esquecer que, face a qualquer situação, quando a motivação e a vontade de manifestação são suficientemente fortes, a nossa atenção e energia focam-se sempre nas “soluções” e tudo, absolutamente tudo pode ser adaptado para servir o nosso propósito ou missão, dentro do Tempo Divino…
Como sempre, acolham apenas o que ressoa para vós dentro do vosso Coração e lembrem-se que são sempre livres de ficar ou de partir, dependendo da forma como se sentem, ou não, em alinhamento com o que ensino, a forma como ensino ou com a própria energia do Shala🪷🍃.

Bhagavagītā III.35

« Lembra-te, o cumprimento dos teus próprios deveres, mesmo que sejam modestos, é melhor que o cumprimento dos deveres alheios, por mais nobres e excelentes que sejam. É melhor terminares a tua encarnação cumprindo o teu próprio dharma! O dharma alheio está cheio de perigos! »
🍃🪷🧘♀️💜🧘♂️🪷🍃

O caminho do Yoga é um caminho solitário. Penso que o mesmo se aplica a todos os outros caminhos de auto-conhecimento, de busca espiritual, de regresso a casa em União com Deus dentro do nosso Coração, mas prefiro falar apenas daquilo que conheço por experiência pessoal… E, por experiência pessoal, posso afirmar que, não só à primeira vista, não só à partida, não só durante os primeiros anos mas, muito provavelmente até que o nosso Coração esteja suficientemente aberto para acolher e ultrapassar, sem julgamentos, a dualidade dentro de nós, nos outros e no mundo à nossa volta, e reconhecer plenamente a Consciência de Unidade em todas as coisas, é muito possível que uma sensação de solidão continue a manifestar-se dentro de nós, à medida que vamos percorrendo este caminho do Yoga, seja qual for a forma como o praticamos.
“O mundo atormentar-vos-á enquanto qualquer parte de vós pertencer ao mundo. É apenas quando pertencemos inteiramente ao Divino que podemos ser livres.”
Sri Aurobindo

Essa sensação de solidão pode aparecer com maior ou menor frequência, de forma mais ou menos intensa e pode ser mais ou menos dolorosa (por vezes é apenas uma evidência plenamente aceite e não provoca qualquer tipo de sofrimento). Pode depender também do nosso nível de entrega e devoção à prática e a Deus, da influência que têm os kleśa (क्लेश - causas de aflição ou sofrimento) sobre a nossa consciência e, consequentemente, sobre as nossas escolhas de vida, da nossa capacidade de adaptação aos eventos externos e internos, aos outros, etc… É uma sensação que pode igualmente ser associada à Noite Escura da Alma, à desconstrução de todos os mecanismos de defesa do ego (अस्मिता asmitā) e do próprio ego espiritual, assim como dos hábitos de vida que tínhamos nos precedentes patamares de consciência e estações de identidade.
"O Yoga não é um caminho fácil, e a mudança total da natureza não pode ser alcançada de um dia para o outro."
Sri Aurobindo

Sempre que algo se transforma profundamente em nós e que somos projetados para a frente, empurrados não só pela vida, mas também pela alquimia da nossa prática espiritual em direcção a uma melhor versão de nós mesmos, em maior alinhamento com as aspirações da nossa Alma, mesmo que estejamos plenamente em paz com essas mudanças que sentimos como justas, é quase certo que, num momento ou noutro, nos sentiremos “sós”, “isolados” ou, pelo menos, “distantes” de uma realidade que deixa de nos ser confortável ou conveniente, mas que pode, nesse momento, ainda não levantar questões para os outros à nossa volta. Ou, pelo contrário, levantar questões como: “Porque é que estás tão diferente? Tu antes não eras assim…”, associadas a um contentamento ou um descontentamento por parte dos outros (esta segunda opção é, infelizmente, a mais comum nas nossas relações mais próximas, principalmente quando elas não são propriamente saudáveis ou equilibradas…). Também podemos sentir-nos sós quando partilhamos o nosso contentamento decorrente dos benefícios da prática e somos confrontados à incompreensão, desinteresse ou indiferença de quem não manifesta o mesmo interesse pelas nossas questões existenciais e espirituais. Quem é que não ficou com vontade de “arrastar” toda a família e os amigos, para que praticassem igualmente Yoga, quando no início se sentiu preenchido com uma sensação de bem-estar e de apaziguamento, para simplesmente constatar, com o tempo e a experiência, que ninguém vai de arrasto para a aventura da busca espiritual? 😉 Todos temos de esperar pelo chamamento dentro do Tempo Divino e antes disso, não há “arrastão” que dê frutos maduros…
“A verdade reside em cada coração humano, e cada um deve procurá-la aí e ser guiado pela verdade tal como a vê. Mas ninguém tem o direito de coagir os outros a agir de acordo com a sua própria visão da verdade.”
Mohandas K. Gandhi
Assim, durante um curto instante ou por períodos mais longos, podemos sentir-nos diferentes dos outros, como se existíssemos numa banda de frequência ou norma diferente, numa espécie de realidade paralela, e pode tornar-se mais difícil comunicar ou interagir com pessoas que estejam ligadas apenas ao seu ego, às necessidades materiais ou cuja frequência do Coração seja significativamente diferente da nossa (por favor, não interpretem isto como uma diferença de valor entre os seres, porque não o é!) ou com o mundo à nossa volta (cuja frequência é, sem sombra de dúvida, muito diferente da nossa, senão não teríamos sequer procurado ou encontrado os ensinamentos do Yoga e nem tão pouco estariam aqui a ler o que escrevo!).
“A normalidade é uma estrada pavimentada: é cómoda de percorrer, mas nela não crescem flores.”
Vincent Van Gogh

Na origem desta solidão, encontramos sempre avidyā (अविद्या), a ignorância metafísica da nossa Verdadeira Essência Divina, que cria em seguida o ego (अस्मिता asmitā), o sentido de individuação que nos separa do outro, reforçado depois pelos apegos (राग rāga), pelas repulsas (द्वेष dveṣa) (que não são mais que outra forma de apego) e pelo medo da morte (अभिनिवेश abhiniveśa). Os kleśa (क्लेश) são a causa primordial do sofrimento humano (दुःख duḥkha), seja qual for a forma que esse sofrimento encontra para se manifestar na nossa vida, no nosso quotidiano ou em qualquer um dos nossos corpos, físico, energético, mental, emocional, espiritual. Da compreensão do seu modo de funcionamento, assim como da libertação da sua influência sobre nós, depende o “sucesso” da nossa prática de Yoga. E, por essa razão, mês após mês, sou guiada a escrever uma e outra vez sobre este tema que parece inesgotável!
ॐ
Yogasūtra II.3
अविद्यास्मितारागद्वेषाभिनिवेशाः क्लेशाः॥३॥
avidyā-asmitā-rāga-dveṣa-abhiniveśaḥ kleśāḥ ॥3॥
« As causas do sofrimento são : a ignorância, o ego, o apego, a repulsa, o medo [da morte]. »
ॐ
Yogasūtra II.4
अविद्याक्षेत्रमुत्तरेषां प्रसुप्ततनुविच्छिन्नोदाराणाम्॥४॥
avidyā kṣetram-uttareṣām prasupta-tanu-vicchinn-odārāṇām ॥4॥
« A ignorância [Avidyā] é o terreno onde crescem os outros, quer estejam latentes, fracos, intermitentes ou intensos. »
ॐ
Parece. Mas não é. Porque um dia, o Yoga deixa de ser simplesmente uma prática, deixa de ser algo que fazemos uma ou várias vezes por semana em cima de um tapete e passa a ser a manifestação daquilo que somos, seres Plenos, Conscientes, Divinos e Livres, UM só com Deus dentro do nosso Coração. E, a partir daí, compreendemos, realizamos e integramos em cada uma das nossas células, que NUNCA ESTAMOS SÓS.
Como poderíamos estar sós, se avançamos com Deus dentro do nosso Coração?
“Tão grande quanto o Universo exterior, é o Universo dentro do lótus do coração. Dentro dele estão os céus e a Terra, o Sol, a Lua, o relâmpago, e todas as estrelas.
O que está no macrocosmo está nesse microcosmo.”
Chāndogyopaniṣad

📸 de autor desconhecido
Realizamos igualmente que o que se manifesta dentro de nós não é diferente do que se manifesta à nossa volta e que o que encontramos no interior, também encontramos no exterior. A partir desse instante, é importante que os nossos pensamentos, as nossas palavras e as nossas acções encontrem o alinhamento à Verdade Suprema e às Leis Universais (ṛta ऋत), pois aquilo que somos, o mundo também o é, e deixa de fazer sentido viver de outra forma, que não seja ao Serviço da Vontade Divina e do Dharma (धर्म - Ordem Cósmica). Obviamente, a forma como se manifestará esse alinhamento na nossa vida e na forma como interagimos com o mundo à nossa volta, depende essencialmente daquilo que temos para realizar durante a nossa encarnação, das nossas características únicas, do nosso karma (कर्मन्) e do nosso svadharma, e é única para cada um de nós. Quando compreendemos claramente a forma como impactamos o mundo, através da autoridade que colocamos em todos os nossos pensamentos, palavras e acções ou mesmo através do nosso silêncio ou da nossa inacção, é muito mais fácil escolher em consciência de que lado da dualidade queremos posicionar-nos e adaptar todo o nosso trabalho pessoal sobre as nossas partes de sombra, de forma a poder ver além dos véus da ilusão e das distorções do mundo em que vivemos.
“Mais uma vez, temos de reconhecer que o indivíduo não existe por si só, mas também através da comunidade, e que a perfeição ou a libertação do indivíduo não é a única intenção de Deus no mundo. O uso perfeito da nossa perfeição, uma vez que tenhamos realizado o símbolo divino em nós, é reproduzi-lo, multiplicá-lo e, finalmente, universalizá-lo nos outros.”
Sri Aurobindo

Para alguns, este alinhamento à Verdade da Natureza Divina do ser humano, que elimina a ignorância e, consequentemente, o ego e também esta solidão provocada pelo sentimento de divisão, de separação, de superioridade ou de inferioridade, é a consequência de uma única tomada de consciência e, por essa razão, manifesta-se de forma imediata. Aliás, alguns seres encarnam-se já impregnados dessa Consciência de Unidade, com o intuito de assistir, acompanhar e ajudar os outros a identificá-la e reconhecê-la também dentro de si. Para a grande maioria de nós, este alinhamento e discernimento surge progressivamente e por etapas, manifestando-se através deste processo solitário e tantas vezes doloroso, a que chamamos VIDA, e pelo qual deveríamos estar infinitamente gratos, apesar de todas as dificuldades e adversidades vividas (mesmo aquelas que vão além da nossa compreensão actual e que pensamos, por momentos, que nunca conseguiremos ultrapassar e Deus sabe que são muitas, tendo em conta o mundo em que vivemos…), pois apenas encarnados enquanto seres humanos, temos a oportunidade e o privilégio de participar activamente e voluntariamente neste processo de ascensão, de evolução espiritual e de Libertação (मोक्ष mokṣa) afim de transcender a dualidade e reconhecer a nossa Verdadeira Essência Divina de Sat-Chit-Ānanda (सच्चिदानन्द - Existência, Consciência, Felicidade) e, mais uma vez, reconhecer que NUNCA ESTAMOS SÓS.
“É por isso que, ao lado dos grandes solitários que procuraram e alcançaram a sua libertação pessoal, encontramos os grandes instrutores espirituais que libertaram também os outros e, supremas entre todos elas, as grandes almas dinâmicas que, sentindo-se mais fortes pelo poder do Espírito do que todas as forças da vida material reunidas, se lançaram sobre o mundo e o agarraram pelo braço, numa luta de amor para o obrigar a consentir à sua própria transfiguração.”
Sri Aurobindo

A verdade é que esta (nem sempre) invisível linha de separação entre o eu e o outro, que faz com que possamos por vezes sentir-nos sós ou isolados, apesar de ser apenas uma ilusão (माया māyā) de um ponto de vista absoluto já que somos TODOS UM, quando estamos ainda enraizados no mundo da dualidade e a funcionar a partir da ignorância e do ego que criam e alimentam um ponto de vista relativo, assim como a subjectividade, essa separação é bem real e pode ser muito, muito difícil encontrar o equilíbrio entre estas polaridades e a conexão ao outro (aparentemente tão diferente de nós) e mesmo ao mundo em que vivemos (não serei certamente a única a sentir que não sou deste planeta, pois não?!). Podemos sentir-nos não só sós, mas também incompreendidos e, muitas vezes, principalmente no início, podemos sofrer bastante com essa solidão, criar carapaças e armaduras de defesa, desenvolver sentimentos de inferioridade ou superioridade que nos cortam ainda mais dos outros, ou mesmo deixar-nos dominar pelo ego espiritual… É como se falássemos uma língua que mais ninguém compreende e que fosse muito, muito, mas mesmo muito difícil comunicar com todos os outros que não a compreendem ou mesmo interagir com o mundo à nossa volta… Mas quando reflectimos bem sobre a questão, é muito provável que possamos identificar essa sensação de solidão (e o consequente desconforto ou sofrimento que lhe está associado…) presente em nós há muito, muito tempo (desde sempre, talvez?), provavelmente muito antes de sentirmos o ímpeto para iniciar a nossa busca ou começar a percorrer o nosso caminho espiritual… Inclusivamente, se olharmos bem para dentro com sinceridade e humildade, talvez possamos mesmo reconhecê-la como um motor, um ponto de partida para esta procura interior de QUEM SOMOS verdadeiramente… Cá dentro, apesar da solidão, acho que sempre soubemos que NÃO ESTAMOS SÓS e, por isso, nos pusemos a caminho de regresso a casa…
“A transformação interior não é o isolamento, não é o distanciamento de uma ação exterior. Pelo contrário, só pode haver uma ação correcta quando há um pensamento correto e não pode haver um pensamento correto se não houver auto-conhecimento.
Sem nos conhecermos a nós próprios, não há paz.”
Jiddu Krishnamurti

Quando colocamos a nossa vontade pessoal exclusivamente ao serviço da Verdade e da Vontade Divina, porque vivemos numa realidade dual, somos inevitavelmente confrontados a uma bifurcação, a uma escolha entre a Luz e a Sombra, entre a Verdade e a Mentira, entre o Bem e o Mal. Se formos verdadeiramente sinceros na nossa busca, poderemos compreender que essa escolha só pode ser feita de forma consciente se aceitarmos olhar para as coisas (ou pessoas ou situações) e vê-las tal como elas são. Dentro e fora de nós. Se queremos avançar na via do Yoga, não podemos desviar o olhar, não podemos olhar parcialmente e nem podemos embelezar a realidade para que nos seja mais confortável. As coisas (ou pessoas, ou situações) são como são e não podemos senão aceitar isso de forma incondicional. Só podemos avançar em confiança e segurança, se cada um dos nossos passos estiver assente sobre fundações firmes e essa firmeza e estabilidade só pode vir da frequência da Verdade (सत्य satya). Toda a verdade sobre nós mesmos, sobre os outros e sobre o mundo que nos rodeia, à medida que nos vai sendo possível acolhê-la. Com integridade, mas sem rigidez nem resistência, assumindo a nossa responsabilidade pessoal pelo ser que somos e tudo o que fazemos, reconhecemo-nos em toda a nossa plenitude e trabalhamos simultaneamente sobre todos os nossos corpos, visíveis ou invisíveis, conscientes que todos eles impactam a realidade que criamos para nós, para os outros e para o mundo, dia após dia.
"Porque um homem não pode fazer o bem numa área da vida enquanto está ocupado a fazer o mal em qualquer outra área.
A vida é um todo indivisível.”
Mohandas K. Gandhi

Assim, depois de compreendermos claramente que a questão da separação é uma ilusão do ponto de vista absoluto e uma realidade do ponto de vista relativo, quer essa compreensão seja plena e celular ou se encontre ainda apenas no corpo mental (sem nunca esquecer que a primeira característica requerida a um yogi, para que possa praticar todos os membros do aṣṭāṅgayoga, alcançar o samādhi (समाधि) e atingir mokṣa (मोक्ष), a Libertação, é śraddhā (श्रद्धा), a FÉ, tal como referido no Y.S. I,20, por isso sabemos que tudo é possível!), naturalmente começamos a cultivar a neutralidade necessária para desenvolver uma maior maestria sobre os nossos sentidos e a desenvolver o discernimento que nos permitirá identificar as diferentes energias e frequências que constituem o mundo das forças e da dualidade, de forma a escolher em consciência onde colocamos a nossa intenção, o nosso consentimento e a nossa autoridade.
“São as pequenas acções quotidianas das pessoas comuns que mantêm a escuridão à distância. Pequenos actos de bondade e de amor.”
J.R.R. Tolkien

No mundo da dualidade em que vivemos, nesta sociedade de valores invertidos, onde as forças do bem e do mal co-existem ao mesmo tempo e, muitas vezes, no mesmo espaço, onde os nossos sentidos são constantemente manipulados para subverter a nossa percepção do mundo e confundir o bem e o mal, o positivo e o negativo, o justo e o injusto, onde constantemente somos bombardeados com inúmeras técnicas de divisão, precisamente com o intuito de nos fazer sentir ainda mais sozinhos ou isolados (dividir para melhor reinar, não é verdade?), nada é mais importante que voltar o nosso olhar para dentro, afim de identificar e discernir as diferentes forças que nos habitam e nos animam em cada instante, de forma a nunca perder a nossa soberania, nem a nossa integridade. O corpo mental e o corpo emocional são facilmente manipulados e condicionados por elementos externos e memórias inconscientes de vidas passadas e através da observação consciente dos nossos pensamentos e das nossas emoções durante a nossa prática espiritual, podemos criar um espaço seguro para analisar e compreender o que realmente pertence à nossa Essência, à nossa Alma, ao nosso Ser e tudo o resto (muitas vezes a grande maioria…), fruto da ignorância, do ego e do ego espiritual.
“Há um lugar no ser interior onde podemos permanecer sempre calmos e, a partir daí, considerar com equilíbrio e discernimento as perturbações da consciência superficial e agir sobre elas para modificá-las. Se conseguirem aprender a viver nesta calma do ser interior, terão encontrado a vossa base estável.”
Sri Aurobindo
Onde há ignorância, há ego.
Onde há ego, há separação.
E onde há separação, pode haver julgamento.
E quando há julgamento, inevitavelmente, manifestam-se igualmente diferentes emoções, como o medo, a raiva, a tristeza ou sensações como a separação, o abandono, a traição ou qualquer outra frequência negativa que, mais tarde ou mais cedo, pode levar-nos a uma espiral descendente.
O julgamento não deve ser confundido com o discernimento, cuja característica principal é a neutralidade através da qual são analisados, sem apegos, todos os dados e informações que nos são transmitidos pelas nossas percepções sensoriais, para serem depois verificados através da ressonância que encontram com a nossa intuição, com a voz do nosso Coração (percepções sensoriais mais elevadas). O julgamento emite uma frequência muito específica que deriva e é amplificada pela influência dos kleśa (todos eles!), uma frequência que nasce muitas vezes a partir de um corpo mental desligado do Coração, pobre em empatia e compaixão naquele instante ou situação, e que nos afasta do centro e empurra inevitavelmente para sentimentos de inferioridade ou de superioridade… O discernimento é um reflexo da Sabedoria, enquanto o julgamento não pode senão ser o fruto de avidyā, da ignorância… É importante conhecermos a diferença entre um e outro e não termos medo de aplicar e exprimir o primeiro, mesmo quando isso implica sermos submetidos ao segundo por parte dos outros. De qualquer forma, a Verdade vem sempre à tona, dentro do Tempo Divino.
“Muitas pessoas, especialmente pessoas ignorantes, querem puni-lo por falar a verdade, por ser correcto, por ser você. Nunca peça desculpa por ser correcto, ou por estar anos à frente do seu tempo. Se tiver razão e o souber, diga o que pensa. Mesmo que seja apenas uma minoria de um, a verdade continua a ser a verdade.”
Mohandas K. Gandhi

📸 de Hugo Ponte
Quando começamos a sentir dentro de nós, com humildade e sinceridade, que cada um de nós está a fazer o melhor que pode, com as ferramentas que tem e colocamos a intenção de começar a verdadeiramente olhar para dentro primeiro, antes de julgar os outros (ou as situações), de tentar controlar ou conformar tudo ou todos à nossa norma e à nossa visão pessoal, interferindo com o seu livre-arbítrio, com o intuito consciente ou inconsciente de apaziguar o desconforto interior causado pela influência que os kleśa ainda têm em nós, podemos finalmente começar a encarnar a mudança e os valores éticos e morais mais elevados que queremos ver manifestados no mundo. Plenamente. Não só em pensamento ou em palavras. Mas agindo concretamente no mundo da dualidade (por muito difícil que ele seja!), plenamente enraizados na Consciência de Unidade. Porque já se sabe que o Yoga não acontece apenas dentro do nosso tapete… E porque apenas desta forma poderemos ser realmente Testemunhas Compassivas de tudo o que acontece em nós e à nossa volta, e fazer do Amor, da Luz, da Verdade, da Compaixão, da Paz e do Perdão as principais e mais eficazes ferramentas da nossa prática de Yoga e, acima de tudo, da nossa Vida…
“Estou demasiado consciente das imperfeições da espécie a que pertenço para me irritar com qualquer membro da mesma. O meu remédio é lidar com o mal onde quer que o veja, não magoar o infractor, tal como eu não gostaria de ser magoado pelos erros que continuamente cometo.”
Mohandas K. Gandhi
Afinal, todos somos seres multidimensionais, com inúmeras características e capacidades que podem ser invisíveis aos nossos olhos físicos, mas não é por isso que não existem (relembro que no Yogasūtra, Patañjali dedica mais de metade do terceiro capítulo, Vibhūtipādaḥ, a descrever essas faculdades extraordinárias e a forma como podem manifestar-se através da prática, afirmando claramente que não são um objectivo, mas sim uma consequência de uma prática dedicada e regular de saṁyama [o conjunto de dhāraṇā, a concentração, dhyāna, a meditação e samādhi, a meditação profunda, um estado contemplativo e de absorção meditativa] sobre certos objectos, da mesma forma que a força e a flexibilidade do corpo físico são uma consequência da prática de āsana e a expansão da nossa energia vital [प्राण prāṇa] é uma consequência da prática de prāṇāyāma…). E o nosso impacto no mundo não vem só através das nossas palavras e das nossas acções que podem efectivamente ver-se no mundo material, mas também através dos nossos pensamentos, das nossas intenções, da nossa energia, da Frequência do nosso Coração. tudo isto pode contribuir para estabilizar ou desestabilizar o equilíbrio e a harmonia do Dharma (धर्म), a Ordem Cósmica e tem, inevitavelmente, consequências. Como dizia muitas vezes aos meus filhos quando eram mais pequenos e tentavam fazer asneiras nas minhas costas, “não é porque eu não vi, que o karma não está atento e a fazer o seu trabalho!”.
“Somos ondas de som e luz desaceleradas, um feixe ambulante de frequências sintonizadas no cosmos. Somos almas vestidas com roupas bioquímicas sagradas e os nossos corpos são os instrumentos através dos quais as nossas almas tocam a sua música.”
Albert Einstein

📸 de autor desconhecido
É através da frequência do nosso Coração que deixamos a nossa impressão no mundo. É através da frequência do nosso Coração que comunicamos verdadeiramente e sinceramente com os outros, mesmo se por vezes a mensagem só é compreendida muito tempo depois, no Tempo Divino (noutras encarnações, por vezes…). É através da frequência do nosso Coração que seremos reconhecidos por aqueles que, ao longo de inúmeras vidas e encarnações, se foram cruzando connosco e nos foram acompanhando ou apoiando ao longo dos nossos caminhos (ou, pelo contrário, prejudicando e dificultando o nosso percurso de Alma e nesse caso, é tempo de corrigir, reabilitar, perdoar). É através da frequência do nosso Coração que podemos igualmente reconhecer a nossa família de Almas (o que acontece mais e mais, dia após dia, à medida que os véus da ilusão se vão desfazendo).
“Não importa quão isolado esteja e quão solitário se sinta, se fizer o seu trabalho de forma verdadeira e consciente, amigos desconhecidos virão à sua procura.”
Carl Jung
É também através da frequência do nosso Coração que podemos sentir todo o potencial luminoso de um ser, assim como as suas partes de sombra (porque vivemos num mundo dual, onde o bem e o mal co-existem e onde temos de escolher, a cada instante, de que lado nos posicionamos, através do discernimento, não do julgamento!), para podermos escolher de forma consciente com quem queremos continuar a interagir e quem devemos deixar partir, e qual é a melhor forma para o fazer, com Paz, Amor, Compaixão e Perdão em todas as situações, sem nunca perder a nossa integridade, a nossa autonomia e a nossa soberania, em todas as nossas relações e situações.
“Mantenha-se afastado de pessoas negativas.
Elas têm um problema para cada solução.”
Albert Einstein

📸 de autor desconhecido
E, para terminar, algo que certamente já sabem, pois já o repeti inúmeras vezes, mas que continuarei a repetir (apesar de ter sido e continuar a ser muitas vezes criticada por fazê-lo), enquanto forma de praticar kṣānti (क्षान्ति), a Paciência, e enquanto sentir que continua a ser necessário, pois infelizmente os exemplos continuam a manifestar-se aos meus olhos (ou ouvidos) uns depois dos outros, revelando assim a importância desta questão não só no mundo do Yoga em particular, mas no mundo da espiritualidade em geral)! Mais uma vez, a Verdade vem sempre à superfície, dentro do Tempo Divino.
A partir da sabedoria que nos transmite o discernimento e sem qualquer tipo de julgamentos, relembro que é igualmente através da frequência do nosso Coração que podemos reconhecer um professor de Yoga, ou qualquer outro guia ou líder espiritual verdadeiramente autêntico, que esteja efectivamente em alinhamento com o Dharma, com as Leis Universais, com a Vontade Divina e cuja intenção, consentimento e Autoridade se encontrem em Deus e apenas em Deus, de forma a estar efectivamente ao Serviço do Yoga, de Deus, do Bem Comum. E sim, isso aplica-se igualmente a mim e, por essa razão, peço-vos sempre que acolham apenas aquilo que ressoa convosco e coloquem de parte tudo o resto! Ninguém deve pedir a um professor que seja perfeito, mas se sentimos ainda necessidade de ser inspirados, guiados ou apoiados por alguém no campo da espiritualidade, devemos deixar de parte as nossas convicções, os nossos ideais e outras certezas fruto do nosso ego e apoiar-nos essencialmente na leitura da frequência do seu Coração a partir do nosso Coração, para tentar encontrar alguém que não ensina mais que aquilo que já integrou e que encarna plenamente, alguém que ama a Verdade acima de tudo o resto, incluindo a verdade sobre si mesmo, alguém que ensina com firmeza, mas muito Amor e Compaixão e é suficientemente íntegro e sincero para, apesar de todas as imperfeições que possam ainda manifestar-se na forma como transmite os ensinamentos, continuar a trabalhar sobre si mesmo. Alguém que seja capaz de se colocar em questão, de reconhecer os seus erros e assumir a sua responsabilidade pessoal na correção dos mesmos (somos todos humanos e estamos todos ainda a caminhar, lembram-se?). O Yoga, assim como todas as outras formas de espiritualidade, não deveriam ser consideradas um negócio e quem ensina deveria fazê-lo apenas porque essa é a Vontade Divina e o seu svadharma, a sua missão de vida e não a partir do seu ego espiritual, para obter energia, fortuna ou reconhecimento.
É a nossa intuição, a voz do nosso Coração, que serve de escudo protector face às manhas e desejos insaciáveis do ego, o nosso e o dos outros. E é a nossa humildade e apenas a nossa humildade que nos pode proteger das ideias de grandeza e da arrogância de um qualquer ego espiritual, ainda mais subtil e insidioso que o ego personalidade, ambos constantemente a tentar desviar-nos da Verdade, pois a Verdade traz a Liberdade e a Liberdade implica inevitavelmente a sua morte.
“Não é sensato estar demasiado seguro da sua própria sabedoria. É saudável lembrarmo-nos de que os mais fortes podem enfraquecer e os mais sábios podem errar.”
Mohandas K. Gandhi

Apenas uma escuta sincera, humilde, paciente e compassiva da frequência do Coração do outro, através do nosso próprio Coração e uma escuta sincera, humilde, paciente e compassiva do nosso próprio Coração, através da frequência do Coração dos outros, pode revelar-nos ONDE realmente nos situamos neste caminho.
Sabemos como manter o nosso centro para manter a paz interior, no meio de uma tempestade?
Sabemos como e quando agir de forma pausada, tolerante e respeitadora face a uma pessoa ou situação conflituosa, incomodativa ou irritante, para não bascular para sentimentos de superioridade, de agressividade ou de controle?
Sabemos identificar quando estamos a proteger a todo o custo, com arrogância e prepotência, as nossas certezas e convicções ou quando estamos a ser suficientemente flexíveis para abrirmos o nosso Coração a diferentes possibilidades, mesmo que isso nos tire da nossa zona de conforto?
Se conseguirmos responder com sinceridade a estas e outras questões, à medida que vão surgindo na nossa vida (sempre, até ao fim!), e aceitarmos lidar com as pessoas (incluindo nós mesmos) e as situações tal como elas são, em vez de como gostaríamos que fossem, saberemos sempre quem está no comando das nossas escolhas e quem verdadeiramente está a divinamente guiar os nossos passos e nunca, nunca mais nos sentiremos SÓS ou, pelo menos, nunca mais sofreremos com a sensação de solidão, mesmo em situações de solitude. Somos Seres Divinos, Soberanos e Livres, pura Existência, Consciência e Felicidade, lembram-se?
“E quando a tempestade passar, não te lembrarás de como a conseguiste ultrapassar, de como conseguiste sobreviver. Nem sequer terás a certeza, de facto, se a tempestade realmente acabou. Mas uma coisa é certa. Quando saíres da tempestade, não serás a mesma pessoa que nela entrou. É disso que se trata a tempestade.”
Haruki Murakami
Como sempre, deixo-vos a minha mais profunda e sincera GRATIDÃO pela vossa leitura e atenção e peço-vos que, como de costume, acolham apenas o que ressoa convosco e coloquem de parte tudo o resto, já que tudo o que partilho convosco é apenas o fruto dos meus próprios questionamentos, experiências de vida, compreensões e integrações alcançadas através dos ensinamentos do Yoga, da minha própria prática espiritual e do meu sādhana (साधन). Com todo o meu AMOR e REVERÊNCIA, desejo-vos coragem, bons questionamentos e boas práticas… Dentro e fora do tapete! Para que um dia, possamos ver no mundo, a mudança que ocorre em nós através do Yoga!
Namaste
✨ 💜 🙏 💜 ✨
Rita
ॐ
ॐ लोकाः समस्ताः सुखिनो भवन्तु
ॐ शान्तिः शान्तिः शान्तिः॥
Oṁ lokā samastā sukhino bhavantu
Oṁ śāntiḥ śāntiḥ śāntiḥ
Oṁ
Que todos os seres, em todos os lugares, sejam felizes.
Que haja Paz, Paz, Paz.
ॐ


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